amagi

amagi

terça-feira, 8 de julho de 2014

«Nós na ONU»: Artur Baptista da Silva e o nosso destino colectivo

A propósito de mais um post no Insurgente, desta feita assinado por Miguel Noronha, lembrando a figura de Artur Baptista da Silva, pergunto-me o que é preciso para se ser levado a sério.

Para que nos ouçam é necessário ter cabelos brancos, se não muitos pelo menos uns quantos, preferencialmente uns óculos com pouca massa, embora agira já se vá usando - uma armação fina continua ainda a dar um ar mais intelectual ao seu portador -, o cabelo, pouco, puxado para trás e envergar umas calças vincadas, uma camisa com botões de punho - sem eles não se é a mesma coisa - uma gravata e um blazer. Se a tudo isto juntarmos uma dicção agradável, um vocabulário requintado quanto baste, que o povo não gosta espertalhões, uma convicção aparente e uns quantos clichés da moda repetidos com um abanar de cabeça que faz os outros pensar que se não acompanham o seu raciocínio então não percebem nada do assunto, então temos homem.

Este caso não é singular por ser raro, nestes moldes exactamente talvez até o seja, mas burlões temo-los em toda a parte. Este apenas teve mais notoriedade porque o autor do acto deambulou descomprometidamente pela Universidade de Verão de um Partido Político e por um programa de televisão, o expresso da meia noite, que se tinha - e tem - como credível e sério.

Este caso faz-nos ir mais longe no raciocínio. Para chegar a algum lado, e o poder é sempre um bom e clássico exemplo disso mesmo, é necessário apenas falar bem, decorar meia dúzia de números - errados ou certos, a maioria não os sabe e os que os sabem, ficando na dúvida, também não corrigem - acreditar na sua própria capacidade para ludibriar e criar uma constelação de correlegionários que o suportem e a quem se pagará quando ao pote se chegar.

Se este caso não servir para mais nada, ao menos que sirva para abrirmos os olhos e confirmarmos o que outros, com responsabilidade de influenciar o nosso futuro, vão dizendo, tentando assim perceber se a lógica ou a racionalidade moram nas suas mensagens. Não basta dizer que temos de baixar o desemprego: há que explicar como. Não chega afirmar que temos de deixar o Euro: é preciso clarificar o que aconteceria à nossas poupanças. Não é suficiente propalar-se aos sete ventos que a economia tem de crescer: há que explicar qual a estratégia para o conseguir e qual o modelo de crescimento que se vai adoptar. Não é justo não dizer que não temos economia para pagar este Estado Social, pois a receita continua estrutural - e não só conjunturalmente - longe de alcançar a despesa -só para que se saiba, nunca na III Républica tivemos superavit nas nossas contas públicas, o que é capaz de explicar muitas coisas -. Não é licito enganar as pessoas fazendo-as crer que com a reestruturação da dívida, ainda por cima unilateral, os salários e as pensões serão repostos e tudo continuará como dantes, porque isso não é verdade. E não vai acontecer. Não é admissível que não se explique às pessoas que descontam para um sistema providencial de tipo Pay as we go e não de capitalização individual, o que na prática quer dizer que os que estão no activo descontam para os que estão neste momento aposentados na esperança, repito, na esperança, que os que lhe sucedem façam o mesmo. Os números é que são o problema. Problema ao qual ninguém liga.

Quem tiver uma calculadora, correcção, um lápis e uma folha de papel e olhos na cara rapidamente vai perceber o embuste para o qual foi trazido.

Olhem a demografia. (1975 - 2.75 filhos por mulher/ 2014 - 1.21 filhos por mulher)

Olhem a esperança média de vida á nascença.(1975 - 68,4 anos/ 2012 - 80 anos)

Olhem o peso do Ministério da Saúde em % do PIB. (1975 - 0,4 %/ 2012 - 6,2 %).

Olhem a duração média das pensões da CGA. ( 1992 - 12.2 anos/ 2013 -18.1 %).

Olhem o número de beneficiário no activo por pensão da SS. (1975 - 3.8/ 2012 - 1,4%)

Olhem as despesas com pensões da Segurança Social em % do PIB. (1975 - 6,7 % / 2012 - 22%)

Olhem as despesas com pensões da CGA em % do PIB. (1975 - 0,4 % / 2013 - 5,1%)

Do the math.

(...)

FONTE- PORDATA

Acima de tudo, precisamos de alguém que fale verdade. Pode doer, mas já nos vai chegando de analgésicos. E, no caso de Artur Baptista da Silva, de placebos.


Sem comentários:

Enviar um comentário