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terça-feira, 19 de agosto de 2014

Os negociadores do Estado e a Regulação do Banco de Portugal

O recente caso da mais que provável falta de rigor na regulação e supervisão do sistema bancário Português por parte do BdP vem, uma vez mais, demonstrar aquilo que os liberais sabem há muito: a história do intervencionismo tem sido mais frequentemente uma história de fracasso do que de sucesso.

Vejamos as coisas como elas tendem a ser. Ao que parece, estão a ser contratados físicos nucleares, matemáticos renomados e cientistas computacionais pelos principais distritos financeiros do globo para, fora daquilo que seria o seu habitat natural, desenharem um conjunto de ferramentas que permitam maximizar a rentabilidade da carteira de produtos financeiros das grandes empresas financeiras da city, de la defense, de Wall Street ou de Tóquio, tornando-os de tal modo complexos que só eles e quem os contrata os percebem. O que acontece de seguida nós sabemos: vendem-nos a governos em que os negociadores governamentais têm muito poucos incentivos para os desmontarem e perceberem o seu verdadeiro alcance. Afinal, como pode um quadro intermédio do Estado jogar de igual com igual com profissionais deste calibre, totalmente dedicados à causa e pagos principescamente pelo seu serviço?

A seguir também temos uma ideia do que se segue. Acusam quem lhes vendeu um produto complexo cuja análise e estudo não foi feita por diversas razões - incapacidade técnica, impreparação e inexperiência polulam seguramente entre as demais, porventura bem menos lisonjeiras para os negociadores nacionais - de lhes terem oferecido um derivado financeiro cujas variáveis analíticas  eles jamais poderiam esperar que produzissem os efeitos depois verificados. Se tivessem lido os contratos talvez tivessem entendido que se não dominavam a ferramenta, o mais avisado seria não a subscrever. O que terão pensado então? «Não, eles seriam incapazes de nos enganarem desta forma. Afinal, somos representantes de um Estado». Reconhecem o paralelismo com a traição que o Governador do BdP diz ter sofrido? Talvez eles também tenham pensado outra coisa. Talvez tenham pensado o seguinte: «Também não vale a pena pensar muito nisso. O que interessa agora é maquilhar as contas, desorçamentar a coisa, fazer de conta que não existe aqui nenhum problema. Quem vier a seguir que feche a porta». Ou, dito de outra maneira, «os contribuintes que paguem. Já é tempo de se irem habituando».

O risco de monopolizar numa só entidade esta função que, por mais que se declare independente, é, na realidade, ou apêndice estatal; é que se a coisa não corre bem, como frequentemente não corre, as consequências podem ser desastrosas. Ao concentrar tanto poder em homens e mulheres que não têm as mesmas ferramentas que possuem aqueles com quem negoceiam, que não têm os mesmos incentivos, que não conseguem contratar a melhor e mais influente sociedade de advogados do País a quem prometem «prémios de jogo», leva-nos a concluir que o resultado final não podia ser diferente.

Tudo isto é já suficientemente mau para ser verdade.

Mas atenção: tudo isto, num futuro mais ou menos longínquo, vai repetir-se. Enquanto se focarem na enunciação das consequências e não na enumeração e ulterior ataques ás causas, isto vai repetir-se. Além disso, quem foge está sempre em vantagem, porque ocupa 24 horas do seu tempo a planear a dissimulação e a semear o equívoco no regulador. O regulador, esse, é mais provável que esteja preocupado com o desconto de IRS no recibo de vencimento desse mês ou na reforma que auferirá volvidos três anos. Numa luta tão desigual, só por milagre as coisas poderiam ser diferentes.

Leitura complementar: artigo do Prof. André Azevedo Alves no Observador. Ver aqui.

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